Pedido foi feito após procuradores entenderem que ex-presidente é suspeito de crime depois de ter postado e apagado vídeo questionando eleições

Porto Velho, RO - A PGR (Procuradoria-Geral da República) pediu e o STF (Supremo Tribunal Federal) aceitou que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) seja incluído no inquérito que apura a instigação e autoria intelectual dos ataques golpistas que resultaram na depredação da sede dos três Poderes, em Brasília.

A inclusão de Bolsonaro no rol de investigados foi decidida pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF.

A solicitação foi feita após 80 integrantes do Ministério Público Federal pedirem ao procurador-geral da República, Augusto Aras, a investigação de Bolsonaro por suspeita de incitação pública à prática de crime.

Os procuradores entenderam que o ex-presidente é suspeito de ter cometido este crime após ter postado no Facebook, na terça-feira (10), um vídeo questionando a regularidade das eleições e apagado depois.

"Ao longo dos últimos anos, Jair Messias Bolsonaro se comportou de forma convergente com amplas campanhas de desinformação envolvendo o funcionamento das instituições brasileiras e as eleições do país", diz o texto dos procuradores.

Segundo eles, Bolsonaro "ocupou o mais alto cargo do país", tem "posição de destaque na câmara de eco desinformativo" e contribuiu "para que a confiança de boa parte da população na integridade cívica brasileira fosse minada". "É à luz desse contexto que deve ser interpretada a postagem", afirmam.

Frederick Wassef, advogado da família Bolsonaro, disse em nota nesta sexta-feira que o ex-presidente sempre foi um defensor da Constituição e da democracia.

"Em todo o seu governo sempre atuou dentro das quatro linhas da Constituição. O presidente Jair Bolsonaro repudia veementemente os atos de vandalismo e depredação do patrimônio público cometidos pelos infiltrados na manifestação, e ele jamais teve qualquer relação ou participação nestes movimentos sociais espontâneos realizados pela população", diz o texto.

No vídeo publicado —e posteriormente apagado— por Bolsonaro, um homem identificado como Dr. Felipe Gimenez ataca a segurança das urnas eletrônicas. A publicação traz ainda as frases "Lula não foi eleito pelo povo. Ele foi escolhido e eleito pelo STF e TSE [Tribunal Superior Eleitoral]".

O pedido ao Supremo não é assinado por Augusto Aras, mas pelo subprocurador-geral da República Carlos Frederico Santos, coordenador do Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos, montado após os ataques do último dia 8.

Carlos Frederico também pediu que seja determinado à Meta (dona do Facebook) a preservação do vídeo apagado e os metadados referentes à postagem, como data e IP, para "melhor auferir sua autoria". Também quer saber informações a respeito do alcance do vídeo, como o número de compartilhamentos e comentários.

O ministro Alexandre de Moraes acolheu as solicitações. Autorizou que a PGR ouça especialistas em monitoramento de grupos de apoiadores de Bolsonaro e grupos extremistas para medir o alcance do vídeo.

O ministro do Supremo também disse que o pedido de interrogatório de Bolsonaro será apreciado posteriormente, visto que o ex-presidente está no exterior.

Na decisão, Moraes destaca que Bolsonaro "reiteradamente, incorre nas mesmas condutas ora investigadas", que são apuradas em diferentes inquéritos no STF, e que elas podem ter contribuído para os ataques golpistas contra as sedes dos três Poderes.

"Observa-se, como consequência das condutas do ex-presidente da República, o mesmo modus operandi de divulgação utilizado pela organização criminosa investigada em ambos os inquéritos anteriormente mencionadas, com intensas reações por meio das redes virtuais, pregando discursos de ódio e contrários às instituições, ao Estado de Direito e à democracia, circunstâncias que, em tese, podem ter contribuído, de maneira muito relevante, para a ocorrência dos atos criminosos e terroristas tais como aqueles ocorridos em 8/1/2023, em Brasília", escreveu o ministro.

O procurador-geral Augusto Aras, indicado ao cargo por Bolsonaro por duas vezes, ficou conhecido pela postura de inércia diante de outras suspeitas de irregularidades praticadas pelo ex-presidente durante o seu mandato.

Em diversas ocasiões, como após a CPI da Covid, a conduta de Aras foi questionada tanto por parlamentares como pelos próprios colegas do Ministério Público Federal.

Na última semana, a pressão interna de outros procuradores sobre o PGR se somou à pressão do governo, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, que esperavam uma resposta do Ministério Público em relação aos ataques na praça dos Três Poderes e Esplanada dos Ministérios.

Aras, então, criou o grupo que combaterá os atos antidemocráticos e colocou a coordenação dessas investigações com Carlos Frederico, retirando poder da vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, conhecida pela proximidade com a família Bolsonaro.

Segundo o subprocurador, na representação enviada ao STF, a suspeita contra Bolsonaro é de incitação porque "não se tem notícia de que atos golpistas dessa estirpe tenham se concretizado posteriormente à publicação atribuída ao representado".

Antes, Carlos Frederico também havia solicitado a abertura de três inquéritos ao STF para apurar os ataques golpistas do domingo passado.

Essas investigações buscam apurar quem foram os executores, financiadores, autores intelectuais e autoridades públicas envolvidas nos protestos.

Fonte: Folha de São Paulo