Bruno Dantas, presidente da Corte e relator do caso, pediu que três responsáveis pela operação indenizem o Estado; cabe recurso da decisão

Porto Velho, RO - A 2ª Câmara do Tribunal de Contas da União (TCU) confirmou, em sessão nesta terça-feira, a condenação que obriga procuradores da Operação Lava-Jato a reembolsar cerca de R$ 2,8 milhões em gastos com diárias e passagens. O ministro Bruno Dantas, presidente da Corte e relator do caso, pediu a condenação e foi apoiado pelos colegas. Cabe recurso da decisão.

Foram condenados o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, responsável por autorizar a criação da força-tarefa da Lava-Jato de Curitiba e por autorizar os deslocamentos de procuradores de outros estados para atuarem lá, o ex-coordenador Deltan Dallagnol, que requisitou membros de outros estados para reforçar a equipe da investigação, e João Vicente Beraldo Romão, então procurador-chefe da Procuradoria da República do Paraná, também responsável.

Eles podem se tornar inelegíveis após uma condenação final pelo TCU, já que, segundo a Lei Ficha Limpa, essa punição ocorre no caso de contas rejeitadas. Cabe à Justiça eleitoral, porém, se manifestar sobre o assunto após a decisão se tornar definitiva, o que ainda não ocorreu.

Deltan Dallagnol é pré-candidato à Câmara dos Deputados pelo Podemos. Em nota, ele disse que irá recorrer da decisão ao plenário do Tribunal de Contas de União, pedindo sua suspensão.

Em novembro do ano passado, o relator já havia condenado os procuradores a reembolsar o Estado pelos gastos do Ministério Público Federal. Segundo Bruno Dantas, o modelo de força-tarefa escolhido pelos coordenadores, em que os procuradores ganhavam diárias e passagens por seu deslocamento a Curitiba, não teve fundamentação.

A argumentação é de que, com esses gastos, os procuradores "praticamente dobraram" sua remuneração com um modelo que deveria ser temporário e "eventual", segundo a lei, mas acabou durando sete anos. O trabalho poderia ter sido realizado pelos procuradores de Curitiba e não por profissionais deslocados de fora, segundo o entendimento do ministro Bruno Dantas.

Em seu voto nesta terça-feira, o presidente do TCU reiterou que os procuradores adotaram "modelo antieconômico que permitia pagamento irrestrito de diárias e passagens a procuradores escolhidos sem critérios objetivos". "A partir da constatação de que a operação seria duradoura, era necessário que os agentes responsáveis pela concepção do modelo tivessem avaliado a economicidade do formato em tela em face das alternativas disponíveis", escreveu o ministro.

A condenação de agora confirmou o que Dantas já havia determinado no ano passado, mas excluiu do rol de responsáveis os integrantes da força-tarefa sem cargos de gestão. A responsabilidade é solidária. Ou seja, os procuradores devem responder igualmente pelo pagamento.

A votação foi unânime entre os três ministros titulares, mas houve embate durante a sessão. Embora não tenha direito a voto, o ministro substituto André de Carvalho, da área técnica do TCU, registrou uma posição contrária ao relatório de Bruno Dantas, argumentando que o pagamento das diárias e passagens foi regular e previsto em lei.

Durante a leitura de seu voto, Dantas o interrompeu para dizer que ele estava "criando confusão" e não teria como votar na matéria. Ao terminar sua fala, André de Carvalho provocou o presidente do TCU:

— Louvando muitíssimo o ministro relator por toda a sua coragem, num momento em que o Brasil não condena todos aqueles que desviaram dinheiro público, mas busca condenar aqueles que trabalharam arduamente na defesa do patrimônio público, por sua coragem, eu elogio o ministro Bruno Dantas.

Em julho, um parecer da área técnica do TCU concluiu que não houve irregularidades no pagamento de diárias de viagem aos procuradores da Lava-Jato e recomendou o arquivamento da investigação. O documento diz que os gestores adotaram medidas para limitar o pagamento dessas diárias e que o modelo de força-tarefa "não implicou violação à regra da economicidade ou aos princípios do interesse público". O relator, porém, não seguiu a recomendação.

Antes disso, em junho deste ano, os procuradores haviam conseguido uma decisão da Justiça Federal do Paraná suspendendo a investigação. Mas o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que não havia irregularidades na atuação do TCU e permitiu que o processo continuasse.

Deltan afirmou, em nota, que "a 2.ª Câmara do Tribunal de Contas da União (TCU) entra para a história como órgão que perseguiu os investigadores do maior esquema de corrupção já descoberto na história do Brasil" e que "este é mais um episódio que mostra o quão longe o sistema político quer ver a Lava Jato do Congresso Nacional e até onde o sistema é capaz de chegar para impedir que o combate à corrupção avance no país".

O procurador da República João Vicente Beraldo Romão não vai se manifestar sobre a decisão, segundo o Ministério Público Federal do Paraná.

Em nota publicada no ano passado, os procuradores da Lava-Jato negam irregularidades. "Os procuradores da República que integraram a força tarefa Lava Jato em Curitiba esclarecem que as diárias e as passagens aéreas referidas foram autorizadas de acordo com os parâmetros legais e normativos, durante a gestão de três diferentes procuradores-gerais da República. Além disso, em todo esse período, nunca foi apontada pela auditoria interna ou pelas autoridades administrativas do MPF qualquer ilegalidade em seu custeio", afirmam.

Os procuradores dizem ainda que concordaram com a limitação do pagamento, a partir de abril de 2015, a 10 diárias mensais, e a partir de maio de 2016, a 8 diárias mensais. "A opção por diárias também resultou em economia com a ajuda de custo, que seria devida em caso de alterações do domicílio legal."

Fonte: O Globo