O governo republicano anunciou 10% adicionais para importação de produtos chineses; o gigante asiático, por sua vez, advertiu que a ação dificulta o diálogo entre os países

A imagem do presidente Xi Jinping é exibida em uma grande tela na China. Foto: HECTOR RETAMAL / AFP

Porto Velho, RO - Pequim advertiu nesta sexta-feira 28 que a imposição de tarifas adicionais de 10% sobre as importações chinesas por parte dos Estados Unidos “afetará gravemente o diálogo” entre os dois países sobre o controle de drogas, ao mesmo tempo que acusou Washington de “chantagem”.

“Pressão, coerção e ameaças não são o caminho correto para negociar com a China. O respeito mútuo é a premissa básica”, destacou o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Lin Jian.

A tarifa anunciada na quinta-feira pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, será adicionada a outros 10% impostos há um mês e deve entrar em vigor na terça-feira 4, ao mesmo tempo que as tarifas de 25% decretadas contra México e Canadá, que foram suspensas há um mês.


Trump faz novo movimento na guerra comercial contra a China e os vizinhos Canadá e México.
Foto: Jim WATSON / AFP

Trump acusa China, México e Canadá de facilitarem a entrada nos Estados Unidos de fentanil, um opioide que provoca muitos danos em seu país.

Ele acusa Canadá e México de não efetuarem controles eficientes em suas fronteiras, e a China de abrigar a produção de precursores químicos da droga.

“A China é um dos países com uma política antidrogas mais rigorosa e exaustiva do mundo. Mas a parte americana sempre ignorou estes fatos”, reagiu nesta sexta-feira o Ministério do Comércio.

“Se a parte americana insistir em seguir seu caminho, a parte chinesa tomará todas as medidas necessárias para defender seus direitos e interesses legítimos”, advertiu.

Guerra comercial em pauta

Além da resposta pública aos EUA, o poder político da China se reúne na próxima semana em dois importantes encontros a portas fechadas para elaborar estratégias que protejam sua economia da guerra comercial.

Embora as grandes decisões já tenham sido adotadas pela cúpula do Partido Comunista, as reuniões simultâneas da Assembleia Popular Nacional e de um importante órgão consultivo, conhecidas como “Duas Sessões”, permitem conhecer as prioridades e preocupações da China.

Poucos dias antes da reunião, o presidente chinês, Xi Jinping, admitiu que a economia do país enfrenta “várias dificuldades”, em um artigo que será publicado esta semana, informou a imprensa estatal nesta sexta-feira.

Xi também destacou que “as condições que apoiam o crescimento a longo prazo e a trajetória positiva geral não mudaram”.

Todos os olhares estarão voltados para a abertura da sessão parlamentar da Assembleia Popular Nacional, na quarta-feira 5, onde o primeiro-ministro Li Qiang revelará as metas de crescimento econômico e de gastos militares da China para 2025.

Os analistas entrevistados pela AFP concordam que Pequim estabelecerá um objetivo de crescimento ao redor de 5%, como no ano passado. Muitos economistas consideram a meta ambiciosa, levando em consideração as dificuldades do país e a relutância dos dirigentes comunistas em aplicar grandes planos de estímulo.

No topo da agenda, provavelmente estará Trump. Em um mês na Casa Branca, o magnata abalou a ordem internacional e demonstrou que está mais imprevisível do que em seu primeiro mandato.

Também há a previsão de que Trump intensificará a estratégia de seu antecessor Joe Biden para afastar a China da cadeia mundial de suprimentos de chips avançados e outros materiais tecnológicos sensíveis.

A campanha empurrou Pequim para uma política de autossuficiência tecnológica que, por exemplo, levou as autoridades a investir mais de 47 bilhões de dólares (274 bilhões de reais) em semicondutores em maio de 2024.

“Pequim considera que um grande estímulo liderado pelo partido em pesquisa, inovação, comercialização, produção e digitalização pode criar novos fatores de crescimento econômico”, afirmaram os analistas Neil Thomas e Jing Qian, da ‘Asia Society’, em um boletim.

A China acredita em “substituir o setor imobiliário e gerar lucros de produtividade que ajudem a mitigar problemas vinculados à dívida, demografia ou dependência do Ocidente”, acrescentaram.

Os analistas também consideram que os planos de Trump podem encorajar Pequim a reforçar as medidas de apoio econômico aprovadas no ano passado, como cortes de taxas de juros, alívio da dívida dos governos locais e subsídios para a compra de residências.

“Esperamos que a China aumente as políticas de apoio em resposta ao grande impacto externo dos Estados Unidos”, disse Wang Tao, economista-chefe para a China do UBS.

Crise imobiliária

Outro problema grave é o consumo doméstico. A demanda interna está em desaceleração há muito tempo na segunda maior economia mundial, o que alimenta uma espiral deflacionária e de preços baixos.

As raízes do problema são profundas, vinculadas a uma falta de confiança em uma economia que, após décadas com um ritmo de crescimento de dois dígitos, definhou com a pandemia de Covid-19.

A persistente crise no mercado imobiliário, que já foi o motor de crescimento e agora está mergulhado em dívidas, virou um símbolo da situação do país.


Vista de Xangai, uma das principais cidades da China. Foto: Hector RETAMAL / AFP

No mês passado, os preços das novas moradias nas cidades mais desenvolvidas da China, conhecidas como “de primeiro nível”, caíram 3,4% em termos anuais, anunciou o Escritório Nacional de Estatísticas.

A queda foi ainda mais expressiva nas cidades de segundo e terceiro nível, onde os preços caíram 5% e 6% em termos anuais, segundo os mesmos dados.

“Nosso diagnóstico dos problemas da China continua vinculado ao setor de habitação”, afirmou Louise Loo, da Oxford Economics.

“Superar os fortes ciclos negativos na economia este ano deveria ser a principal tarefa dos líderes políticos”, acrescentou.

Fonte: Carta Capital