Imprensa tem documentado casos recentes ao menos em Rondônia e Santa Catarina

Porto Velho, RO - Às 10h15 da quinta-feira (2), o telefone tocou na secretaria de um colégio particular de pequeno porte em Perdizes, zona oeste de São Paulo. Do outro lado da linha, um sujeito falava alto e rápido. Aos gritos, exigia urgência. Mencionando nome e endereço da escola, dizia estar na vizinhança, com mais três pessoas — todas armadas — monitorando o movimento. Exigia uma transferência em dinheiro para não cumprir a ameaça: "faz o Pix ou vamos passar na frente atirando. E, depois, invadir."

Era uma tentativa de golpe. "Os policiais que atenderam nosso chamado disseram que no mesmo dia outros comércios do bairro também sofreram ameaças semelhantes", diz Rafael dos Santos Martins, coordenador geral da escola. No caso da escola, com a recusa em realizar o depósito, o autor do esquema foi se irritando até desligar o telefone, sem falar em valores ou passar a chave para a transferência bancária.

"De fato, é uma variação do golpe do Pix", afirma a advogada Maria Tereza Grassi Novaes, da Comissão de Advocacia Criminal da OAB-SP. Na versão "original", o golpista simula o sequestro de um parente da vítima, pedindo dinheiro em troca da sua libertação. Na versão "escolar", entra em cena o temor de massacres em colégios para extorqui-los. "Extorsão é crime previsto no Código Penal. No caso da escola, o Pix foi usado para obtenção de vantagem indevida mediante o constrangimento da vítima, e sob grave ameaça à sua integridade física e de terceiros".

Consultadas pela coluna, a Secretaria Municipal da Educação e as Polícias Civil e Militar de São Paulo dizem não ter registros de ocorrências do tipo em escolas. Mas a imprensa tem documentado casos recentes ao menos em Rondônia e Santa Catarina. No final de fevereiro, em Florianópolis, a proprietária de uma academia de dança cedeu aos criminosos que ameaçavam fazer os alunos de reféns e transferiu o dinheiro pedido pelos golpistas.

A preocupação com as ameaças é compreensível. Epidêmicos nos Estados Unidos, os massacres escolares cresceram significativamente nos últimos anos também no Brasil. De acordo com levantamento do Instituto Sou da Paz, divulgado em novembro de 2022, nos últimos 20 anos, foram registrados 12 tiroteios em massa em ambientes escolares. O mais letal foi o de Realengo (RJ), em 2011, com 12 mortos e 13 feridos. O mais recente foi o de Aracruz (ES), no ano passado, em que duas escolas foram atacadas por um mesmo atirador, resultando em quatro mortos e 12 feridos.

Maria Tereza diz que até o momento não há registros de escolas que tenham sido vítimas de tiroteios em massa por se recusarem a pagar o dinheiro exigido pelos criminosos. "Os casos de massacres em dependências escolares costumam estar relacionados a muitos outros fatores, e não à vantagem financeira. Não há elementos para afirmar que as escolas devem temer a possibilidade real de esse golpe escalar para uma coisa mais grave".

Para a advogada, as escolas devem estar cientes dessa nova modalidade de golpe para que, se forem vítimas, saibam reagir com tranquilidade e consigam identificar os responsáveis. "Se possível, deve-se gravar a ligação telefônica, anotar o número que entrou em contato, registrando queixa imediatamente à equipe de segurança do colégio e às autoridades policiais".

"Por precaução, deve-se garantir o acesso ao prédio da escola apenas aos alunos, seus pais ou responsáveis, e aos funcionários, evitando assim a entrada de qualquer outra pessoa estranha às suas dependências", afirma Maria Teresa.

Outro ponto importante: "A escola deve sempre priorizar a transparência com os alunos e seus responsáveis, informando-os abertamente sobre o ocorrido e comunicando-os das medidas de segurança que devem ser adotadas a partir de então."

A escola seguiu esse receituário. "Em uma situação dessa, a preocupação é com a segurança de todos", diz Rafael. A providência foi encaminhar todos para dentro das salas de aula, movimento que gerou necessidade de diálogo franco com as crianças e jovens.

"Após o contato com a polícia e a confirmação de que se tratava de um golpe, realizamos rodas de conversa para explicar as ações e adaptações na rotina. Percebemos que todos ficaram mais tranquilos. Entendemos que falar sobre a realidade, sempre tomando os cuidados de não ressaltar os aspectos de terror, é uma forma de respeito às crianças e adolescentes. A fantasia de imaginar o que poderia estar acontecendo é muito mais angustiante", diz o coordenador geral.

Com a situação controlada, as famílias foram avisadas. Um comunicado apareceu nas telas de computadores e celulares das famílias cerca de 2 horas depois do trote telefônico. "Foi uma decisão difícil, mas entendemos que a transparência é fundamental para a relação de confiança entre a comunidade escolar."

Mesmo assustada, a comunidade aprovou a comunicação. "Quase não tivemos famílias buscando os filhos ou deixando de trazê-los no período da tarde", afirma Rafael. "Nunca imaginei ter de lidar com esse tipo de ocorrência. Há uma profunda tristeza de contemplar que esse tipo de violência faz parte da realidade."

Fonte: Portal SGC