Medidas devem ser anunciadas no Palácio do Planalto nesta quinta (12), com presença de Lula

Porto Velho, RO - O pacote de medidas econômicas a ser anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), vai centrar esforços na recuperação da arrecadação do governo federal e inclui a retomada do voto de desempate a favor da União em disputas tributárias com contribuintes.

O anúncio está programado para esta quinta-feira (12) no Palácio do Planalto e deve contar com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), num sinal de apoio político às iniciativas —muitas delas impopulares, pois significam na prática um aumento de tributos.

Os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) também são aguardados para o anúncio. Apesar dos atos golpistas que resultaram na depredação das sedes dos três Poderes, a equipe decidiu manter o cronograma planejado para dar uma demonstração de que o trabalho do governo continua.

O foco do time econômico é a redução de um déficit de R$ 231,55 bilhões projetado para este ano, que foi classificado como "absurdo" por Haddad em seu discurso de posse. O mercado cobra uma sinalização firme de redução desse rombo para manter a dívida pública em patamar sustentável.

O pacote deve incluir quatro MPs (medidas provisórias), dois decretos presidenciais, uma portaria interministerial e uma portaria conjunta da Receita Federal e da PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional).

Uma das MPs buscará restabelecer o chamado "voto de qualidade" no Carf (Conselho de Administração de Recursos Fiscais), tribunal administrativo que julga conflitos tributários.

O voto de qualidade assegurava à Receita a manutenção da cobrança em caso de empate no julgamento —algo comum em disputas envolvendo grandes valores, uma vez que o tribunal é formado por representantes do Fisco e dos contribuintes.

Sensível a interesses de grupos, o Congresso fez ao longo dos anos uma série de investidas contra o voto de qualidade e finalmente obteve sucesso em 2020, durante o governo Jair Bolsonaro (PL). Naquele ano, o desempate em favor da Receita foi extinto, impondo derrotas bilionárias à União em novos julgamentos.

Durante as discussões, o governo chegou a levantar dúvidas jurídicas sobre a possibilidade de retomar o voto de qualidade, uma vez que o STF (Supremo Tribunal Federal) caminhava para se manifestar a favor da legalidade da mudança feita em 2020 —o julgamento foi suspenso em março de 2022 por um pedido de vista.

Apesar do risco, a medida acabou sendo incluída no pacote a ser anunciado por Haddad, que tem dado ênfase aos problemas a serem enfrentados no Carf. O ministro tem chamado atenção para o aumento significativo do estoque de processos, que saltaram de R$ 600 bilhões para R$ 1,2 trilhão em quatro anos.

Em entrevista à Folha, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, disse que "ter uma solução para o Carf é essencial".

Em debates internos na semana passada, a equipe de Haddad chegou a discutir ações de receitas extraordinárias, como um "incentivo à redução da litigiosidade no Carf", cujo potencial era calculado em R$ 53,77 bilhões.

Outra opção é um "incentivo extraordinário à denúncia espontânea", estimado em R$ 33,77 bilhões.

O pacote de medidas também deve incluir a reversão de desonerações tributárias adotadas pelo governo anterior. Uma delas mira o corte nas alíquotas de PIS/Cofins sobre receitas financeiras de grandes empresas, cujo impacto seria próximo a R$ 4,4 bilhões.

Outra medida que estava nas discussões prévias é o aproveitamento de créditos de ICMS, imposto estadual, pelas empresas. Ela tem relação com o julgamento no STF que retirou o ICMS da base de cálculo de PIS/Cofins nas operações de venda feitas pelas empresas.

O problema é que o julgamento não contemplou as aquisições de insumos das companhias, que continuavam considerando o ICMS na base de cálculo dos tributos federais nessas operações porque isso era mais vantajoso —elas ficam com um crédito tributário maior a ser abatido posteriormente.

Na prática, segundo técnicos, a distorção permite que os contribuintes usem como crédito um tributo que não foi pago. Por isso, há a possibilidade de se corrigir o problema via MP, restabelecendo uma cobrança de ao menos R$ 30 bilhões em tributos. Essa medida teria um impacto mais duradouro sobre a arrecadação do que outras tidas como extraordinárias, centradas em 2023.

Também havia, nas discussões preliminares, um impacto estimado em R$ 28,7 bilhões com a reoneração de tributos federais sobre gasolina e etanol a partir de março.

No início do ano, Lula editou uma MP prorrogando a desoneração sobre combustíveis, com validade de 12 meses para diesel e gás de cozinha e de 60 dias nos demais casos. Haddad vinha justificando a medida como o tempo necessário até se ter a passagem de bastão no comando da Petrobras —que será presidida por Jean Paul Prates. O objetivo é obter uma solução estruturam em conjunto com a companhia.

O pacote de Haddad ainda deve trazer medidas para reduzir despesas, como revisão de contratos e programas —cujo impacto era estimado em R$ 15 bilhões nas discussões preliminares.

Em entrevista à Folha, Ceron afirmou que a agenda precisava envolver tanto o ganho de arrecadação quanto a redução de despesas, mas argumentou que o aumento de receitas não significava uma expansão da carga tributária. "Trata-se de discutir a manutenção da carga tributária que existia ao final de 2022", afirmou na ocasião.

"A receita líquida do governo federal deve ficar em torno de 18,7%, 18,8% do PIB em 2022. Para 2023, as renúncias tributárias feitas no ano passado derrubam 1,5 ponto percentual do PIB. A receita líquida cai para 17,2% do PIB. Isso significa mais de R$ 100 bilhões renunciados sem lastro. É um grande impacto", disse.

Fonte: Folha de São Paulo