Na imagem, a ex-ministra Damares Alves participa de convenção do Republicanos - Pedro Ladeira - 05.ago.2022/Folhapress

Folha, Thiago Resende, BRASÍLIA - Senadora eleita pelo Distrito Federal e ex-ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves (Republicanos) não é clara ao tentar explicar a origem dos supostos casos de exploração e abuso de crianças no Pará que ela descreveu durante um culto, .

Damares dá diferentes versões sobre o surgimento das supostas denúncias, citando como origem CPIs (comissões parlamentares de inquérito) já encerradas, a ouvidoria do ministério e depoimentos de moradores da Ilha de Marajó (PA).

Após ser questionada diversas vezes por mais detalhes, a ex-ministra passa a dizer que os casos estão em um inquérito sigiloso, e, por isso, não poderia dar mais informações. "Eu vou pagar o preço por muito tempo ainda de acharem que eu menti, mas é para preservar as investigações. Aguardem", afirmou à Folha.

Em vídeo propagado pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), ela afirma durante um culto evangélico que saberia de casos de estupros de recém-nascidos, além de casos de crianças de 3 e 4 anos que teriam dentes arrancados para praticar sexo oral e que seriam obrigadas a se alimentar de comida pastosa para ter o intestino livre para sexo anal.

No vídeo, Damares continua o discurso dizendo que o presidente Jair Bolsonaro (PL) determinou que o governo fosse atrás de todas essas crianças e que o "inferno se levantou contra ele" —citando em seguida, sem uma ligação clara, a imprensa, o Supremo Tribunal Federal e o Congresso como agentes que agem em uma "guerra" contra o presidente.

Damares disse que as denúncias foram devidamente encaminhadas às autoridades, como o Ministério Público.

O Ministério Público Federal, por sua vez, afirma que atuou em inquéritos sobre supostos casos de tráfico internacional de crianças desde 1992 no arquipélago do Marajó e que, em 30 anos, nenhuma das denúncias mencionou nada semelhante ao citado pela ex-ministra.

Os promotores aguardam esclarecimentos sobre as declarações para que o caso seja investigado. "A gente vai ter que entender", respondeu Damares sobre a solicitação do Ministério Público.

O relator da CPI da Assembleia Legislativa do Pará, Arnaldo Jordy (Cidadania), já disse à Folha que também nunca ouviu falar nos casos citados pela ex-ministra.


A senhora pode explicar melhor o que sabe sobre o caso? Se você assistir ao vídeo todo, eu falo de fronteiras. Claro que a gente começa cuidando das crianças de Marajó. Nós temos duas CPIs da Câmara [ambas já encerradas], que já apontavam o tráfico de crianças naquela área. E temos a própria CPI da Assembleia Legislativa do Pará que mostrava a exploração sexual de crianças. Então só de CPI, só de encaminhamento para Ministério Público, tinha três já. Fora as denúncias. Agora, todas as denúncias que chegaram na nossa ouvidoria foram encaminhadas para as autoridades competentes.

Por que a senhora não falou sobre esses casos antes? Sempre falei. Só estou achando estranho estar sendo divulgado agora em período eleitoral.

Mas como a senhora recebeu a denúncia? Populares. Por isso que a gente cria o Disque 100 dentro de barcos. A gente quer as pessoas possam se empoderar, ter coragem de denunciar. Como elas iam ligar para denunciar se nem energia elétrica tinha? Se nem conectividade tinha? Então a minha resposta imediata foi colocar barcos em região ribeirinha e nossa equipe da ouvidoria andar de cidade em cidade. Todas as denúncias que chegaram na ouvidoria foram devidamente encaminhadas.

O que significa encaminhar? Seria repassar a denúncia para o Ministério Público? Quando eu assumi, fizemos termo de parceria e cooperação com CNJ [Conselho Nacional de Justiça], com Conselho Nacional do Ministério Público e com os Ministérios Públicos estaduais. Os acordos são para que toda denúncia que chegasse até nós fosse para o Ministério Público.


Damares participa de evento no Palácio do Planalto Pedro Ladeira - 9.nov.2020/Folhapress

Em relação às denúncias que a senhora citou sobre a Ilha de Marajó. A senhora se lembra de quando recebeu essa denúncia e o que fez? Conversei com todas as autoridades locais. Minha equipe esteve dentro da Ilha de Marajó conversando com as autoridades locais, com o Ministério Público, com juízes, conselheiros tutelares e promotores. As pessoas falam mais abertamente com o Ministério dos Direitos Humanos do que com a polícia. Então as pessoas têm mais acesso aos conselheiros tutelares. Tudo isso que foi colhido foi encaminhado às autoridades.

Então o Ministério Público já tem o material sobre essas denúncias na Ilha de Marajó? Não é só Ilha de Marajó. No vídeo eu falo do programa Abrace Marajó, mas nós vamos levar para todas as áreas de fronteira. Se você assistir o resto do vídeo, eu falo fronteiras. Eu não tenho fronteiras só no Marajó. Tenho fronteira em todo lugar.

Mas o Ministério Público do Pará pediu para que a senhora dê mais explicações sobre essas denúncias. Pois é… a gente vai ter que entender.