Pressões de Bolsonaro sobre a empresa e as posições de Lula contra as privatizações afastam potenciais compradores das três principais refinarias colocadas à venda pela estatal

Porto Velho, RO - A proximidade das eleições se tornou um obstáculo a mais para a venda de três importantes refinarias da Petrobras – Refap (RS), Repar (PR) e Rnest (PE) –, que recentemente foram recolocadas para avaliação do mercado pela estatal.

As três refinarias são bem vistas no setor, mas não têm atraído grande interesse das empresas. Segundo fontes do mercado ouvidas pela reportagem, mesmo grupos para os quais faz todo sentido investir em refino, como as grandes distribuidoras, estariam mais reticentes a entrar no negócio a três meses do pleito que deve ser protagonizado pelo ex-presidente Lula (PT) e o atual presidente Jair Bolsonaro (PL).

Nesta sexta-feira, 15, a Petrobras decidiu estender para o dia 29 o prazo limite para a manifestação de empresas interessadas nas refinarias. O prazo venceria hoje e o adiamento é um sinal de que a procura foi baixa. Questionada sobre a decisão, a Petrobras não se pronunciou.

Fontes de mercado dizem que é possível haver ofertas até a nova data no fim do mês, por se tratar de negócios com demanda certa e pelo setor de refino estar em um momento de margens de lucro recordes. Ainda que haja interesse, no entanto, o número de potenciais compradores será reduzido e bem inferior ao registrado na virada de 2019 para 2020, quando a Petrobras fez uma primeira tentativa fracassada de vender as unidades.

À época, o ex-presidente da companhia Roberto Castello Branco, chegou a dizer que havia pelo menos 20 interessados nas refinarias. O Estadão/Broadcast informou que pelo menos 10 empresas estavam atentas à venda, caso das distribuidoras nacionais de combustíveis Ultrapar e Raízen, além de estrangeiras, como as suíças Vitol e Glencore, as americanas Valero e CVR Energy, as chinesas PetroChina e Sinopec, e o fundo árabe Mubadala, que terminou comprando a Refinaria Landulpho Alves (Rlam), hoje Refinaria de Mataripe (BA).

Dois anos e meio depois, a história é bem diferente. O presidente Bolsonaro, em fim de mandato, pressiona a Petrobras para segurar preços, e Lula, contrário às privatizações, é líder nas pesquisas de intenção de voto. Ambos comportamentos afugentam investidores.

Um estrategista próximo ao processo diz que, se a Petrobras quiser de fato vender as unidades, terá de ser mais flexível nos preços desta vez e dar descontos que compensem o risco e a necessidade de realizar algum investimento que, afirma, não é tão grande como querem fazer crer alguns investidores.

No caso da Refinaria Abreu e Lima (Rnest), que não recebeu ofertas da primeira vez, atrapalha a não conclusão de um segundo trem que dobra sua capacidade de produção.

Professor da PUC-RJ, Edmar Almeida, que não leva fé no processo, diz que só os grandes grupos de distribuição nacionais, como Cosan e Ultra, ou fundos internacionais, a exemplo do Mubadala, podem vir a se apresentar.

Nos bastidores, porém, fala-se que o grupo Ultra não deve voltar à carga, depois da frustração nas negociações para a compra da Refinaria Alberto Pasqualini (Refap) no fim do ano passado. O grupo teria oferecido R$ 1,5 bilhão, mas a Petrobras fez pedidos mais altos ao longo do processo. Procurado, o Ultra, que é dono da Ipiranga e Ultragaz, não se pronunciou.
A importância das refinarias

As três refinarias estão entre as maiores da Petrobras e foram colocadas à venda junto das suas unidades de logística. A Refinaria Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco, tem capacidade de refinar 230 mil barris de petróleo por dia e pode dobrar de volume após a construção de mais um trem de refino, que fazia parte do projeto original, mas não foi concluído. Se finalizada, se tornará a maior refinaria do País.

Já a Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), no Paraná, tem como atrativo a produção de biocombustíveis (diesel verde e bioquerosene de aviação) e uma capacidade de 207 mil barris diários. Também com quase a mesma capacidade (207 mil barris por dia), a Refinaria Alberto Pasqualini (Refap), no Rio Grande do Sul, atende toda a Região Sul e exporta o excedente.

Juntas, as três unidades são responsáveis por metade do volume de produção entre as oito refinarias que a estatal se comprometeu a vender em um acordo fechado em 2019 com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para desconcentrar o mercado de refino no Brasil.

A produção das oito refinarias incluídas no plano corresponde à metade da capacidade de refino da Petrobras – cerca de 1,1 milhão de barris de petróleo por dia. Das oito, apenas uma passou para as mãos da iniciativa privada, na Bahia. Outras três, de menor porte, estão em processo de venda: Reman (AM), Lubnor (CE) e SIX (PR), mas pouco produzem.

A retomada do esforço de privatização das duas refinarias do Sul (Refap e Repar), e de Abreu e Lima (Rnest), no Nordeste, pegou o setor de óleo e gás de surpresa no fim de junho.

Para analistas do Brasil e do exterior ouvidos pelo Estadão/Broadcast, a iniciativa se aproxima de um "factóide", possivelmente um esforço do governo Bolsonaro para sinalizar aos agentes que ainda há disposição de venda das unidades, sem que isso seja viável antes da eleição ou mesmo até o fim do ano.

"Acho que esse anúncio foi para jogar para a torcida, não tem calendário até o fim do ano para promover a venda de três (refinarias) ao mesmo tempo", avalia o ex-diretor da ANP (Agência Nacional de Petróleo e Gás), Helder Queiroz. Ele observa que mudar estruturalmente o mercado de refino leva tempo e que é preciso ter cuidado para não formar monopólios regionais.

A venda da Refinaria Landulpho Alves (Rlam), hoje Refinaria de Mataripe, na Bahia, é um exemplo do tempo necessário para concluir um negócio do tipo. A Petrobras anunciou a venda para a Acelen, um braço do fundo de investimentos árabe Mubadala, por US$ 1,65 bilhão em março do ano passado, e somente em novembro a operação foi efetuada de fato, com a Acelen assumindo a unidade.

Para o analista de petróleo da Ativa Investimentos, Ilan Arbetman, é possível que até o final do prazo estipulado pela Petrobras – 29 de julho – a estatal receba ofertas não vinculantes, mas que é muito difícil o processo avançar em meio a conjuntura atual.

"Tanto compradores estratégicos, como aqueles com objetivos financeiros estão tendo dificuldades em enxergar uma capacidade perene de geração de valor diante das condicionantes que temos hoje", disse o analista, que lista como possíveis interessados a Ipiranga, que demonstrou interesse pela Refap na primeira frustrada tentativa de venda, e a Shell, que tem experiência no setor.

Ele prevê que o prazo pode ser novamente adiado, já que as refinarias são de grande porte e envolvem alguns bilhões de reais.

"A gente até pode ter players (empresas do setor) que aceitem e se cadastrem para essa etapa, por mais que tenha sido adiada, mas não vejo andamento forte dessa pauta ao longo do ano. A gente tem o adiamento das propostas vinculantes, que é um pouco mais sério, até agosto, e não dá para ter certeza se esse prazo não vai ser adiado novamente, porque é muito difícil discutir termos tão grandes, é normal ter adiamento nesses casos", explicou.

Fonte: Estadão