Governo ucraniano avalia que corredores humanitários anunciados pelos russos são tentativa de 'criar imagem desejada para a televisão' usando o sofrimento dos cidadãos

Porto Velho, RO - A Ucrânia criticou a tentativa russa de abrir nesta segunda-feira corredores humanitários a partir de várias cidades ucranianas, incluindo a capital Kiev, com destino a áreas dominadas por Moscou. O governo de Vladmir Putin determinou que civis poderão deixar áreas de conflito por seis rotas, mas apenas duas não terminam em cidades da Bielorrússia ou Rússia. Autoridades ucranianas defendem que cidadãos devem ter o direito de sair para todo o território do próprio país.

— Esta é uma história completamente imoral. O sofrimento das pessoas é usado para criar a imagem desejada para a televisão. Estes são cidadãos da Ucrânia, eles devem ter o direito de se locomover para o território da Ucrânia — disse um porta-voz do presidente Volodymyr Zelensky à Reuters.

A ministra de Territórios Oupados da Ucrânia, Iryna Vereshchuk, também descreveu a proposta russa como "inaceitável".

— Esta é uma maneira inaceitável de abrir corredores humanitários. Nosso povo não irá de Kiev para a Bielorrússia para depois ser levado para a Federação Russa — disse Vereshchuk, conforme a BBC.

Nesta segunda-feira, o Ministério da Defesa da Rússsia informou que seus militares vão reduzir ataques e vão abrir corredores humanitários em várias cidades ucranianas, após combates interromperem os esforços de retirada de civis ucranianos, com várias vítimas fatais.

Os corredores deveriam abertos às 10h de Moscou (4h de Brasília) da capital Kiev, bem como das cidades de Kharkiv, Mariupol e Sumy, e seriam instalados a pedido pessoal do presidente francês Emmanuel Macron, disse o ministério russo.

De acordo com mapas publicados pela agência de notícias RIA, no entanto, o corredor de Kiev conduz à Bielorrússia, país cujo governo é aliado de Putin, enquanto os civis de Kharkiv terão apenas um corredor com destino à Rússia à disposição. Os corredores de Mariupol e Sumy levarão a outras cidades ucranianas e à Rússia. Aqueles que quiserem deixar Kiev também poderão ser transportados de avião para a Rússia, disse o ministério, acrescentando que usaria drones para monitorar o êxodo.

No fim de semana, houve uma tentativa fracassada de retirar civis das áreas de conflito, com a ocorrência, inclusive, de mortes, quando forças russas dispararam morteiros, no domingo, sobre uma ponte usada por um grupo que fugia dos combates nos arredores de Irpin, matando três pessoas de uma família.

Duas operações de retirada de civis planejadas de Mariupol e na cidade vizinha de Volnovakha, no Sul da Ucrânia, falharam nos últimos dias após os dois países se acusarem mutuamente de não interromperem bombardeios. Em Mariupol, as autoridades ucranianas disseram que planejam retirar mais de 200 mil civis, metade da população da cidade.

Separatistas pró-Rússia realizaram uma ofensiva em Mariupol neste domingo, e os combates ocorreram principalmente na parte Oeste da cidade, disse o Ministério da Defesa da Rússia nesta segunda-feira.

O porta-voz do Ministério da Defesa russo, Igor Konashenkov, acusou as forças ucranianas de usar um grupo de mais de 150 civis como escudos humanos para disparar contra as forças separatistas.

Ele disse que quatro civis foram mortos e cinco ficaram feridos como resultado, mas que as forças da República Popular de Donetsk, região no Leste da Ucrânia reconhecida como independente por Moscou, "libertaram" cerca de 150 civis, levando-os para o território que controlavam.

Confira as rotas determinadas pela Rússia:

Mariupol
Rota 1: Novoazovsk, Taganrog, Rostov-on Don (Rússia), depois por via aérea, rodoviária ou ferroviária para um destino escolhido ou local de espera temporário;
Rota 2: Portivske, Mangush, Respublika, Rosivka, Bilmak, Polohi, Orekhiv, Zaporizhzhya (Ucrânia)

Kharkiv
Nekhoteyevka, Belgorod (Russia) e depois rota aérea, rodoviária ou ferroviária
Sumy
Rota 1: Sudzha, Belgorod e depois rota aérea, rodoviária ou ferroviária;
Rota 2: Sumy, Golubivka, Romny, Lokhvitsya, Lubny, Poltava (Ucrânia)

Kiev
Hostomel, Rakivka, Sosnovka, Ivankiv, Orane, Chernobyl, Gden', Gomel (Bielorrússia), depois por via aérea para a Rússia

Crise de refugiados

No domingo, chegou a 1,5 milhão o número de pessoas que fugiram da Ucrânia desde o início da invasão russa. Segundo a ONU, os ucranianos obrigados a deixarem seu país hoje representam quase 2% das pessoas deslocadas em todo o mundo por guerras, conflitos, violações de direitos humanos e perseguições. No fim de 2020, o total acumulado era de 82,4 milhões de pessoas, o maior já registrado pelo Acnur, a agência de refugiados da ONU.

De acordo com o relatório "Tendências globais", mais de dois terços de todos os refugiados e deslocados vêm de cinco países: Síria (6,7 milhões), Venezuela (4 milhões), Afeganistão (2,6 milhões), Sudão do Sul (2,2 milhões) e Mianmar (1,1 milhão). Os números abrangem refugiados, solicitantes de refúgio e pessoas deslocadas à força dentro de seus próprios países.

Fonte: O Globo